Bíblia do Politicamente Correcto
O Novíssimo Testamento, Salmo I - São Louçã, padroeiro dos criminosos
Era uma manhã ensolarada. Louçã conduzia a sua viatura por uma estrada rodeada por arbustos e árvores floridas, que serpenteava entre prados verdes. Louçã não era ainda santo. Por esta altura Louçã, Chico para os amigos, era ainda apenas e tão somente o líder de um pequeno grupelho fundamentalista. No entanto, esta mesma manhã, a sua vida iria mudar.
Kilómetros à frente, um jovem Afro-Português jazia estendido no alcatrão quente da estrada. Uma viatura aproxima-se, e quando dão pelo jovem jazendo imóvel no asfalto, a viatura pára e um casal sai apressadamente do carro para o socorrer. Nesse momento o jovem levanta-se de arma em punho, e dos arbustos e árvores circundantes salta um bando armado de caçadeiras e pistolas automáticas. Era uma emboscada. Carjacking. O casal é barbaramente agredido, a mulher é violada e roubam-lhes todos os bens antes de os abandonarem inanimados e cobertos de sangue.
No instante em que o bando se preparava para entrar no carro acabado de roubar com o intuito de assaltar uma gasolineira, o carro dirigido por Louçã chega ao local. Louçã interrompe então o sermão sobre as virtudes do casamento gay que dirigia aos prosélitos que o acompanhavam e diz-lhes "venham, precisamos ajudar as vítimas".
Louçã dirige-se então ao gang e diz-lhes "Irmãos, estou aqui para vos ajudar. Vós sois as vítimas do neo-liberalismo, das políticas do governo e da falta de apoio social". Os membros do gang entreolharam-se e Louçã continuou dirigindo-se ao mais jovem, um jovem a quem chamavam Antonino, "tu irmão, andas aqui apenas porque não tens emprego". E o jovem retorquiu-lhe num dialecto chamado Crioulo: "Mano, eu trabalhar? Você está louco? Além disso tenho 13 anos, não tenho idade legal para trabalhar". Louçã afastou com os pés o casal ensanguentado para trás de um arbusto fora da vista de todos e dirigindo-e a outro membro do gang diz-lhe: "irmão, tu estás aqui porque vives num bairro degradado". O jovem ficou pensativo por uns instantes como que meditando "toda a gente diz que o nosso bairro há 20 anos era muito bonito... mas depois partimos tudo. Ainda ontem incendiamos mais uns automóveis e uns contentores. Sim, está tudo destruido, tudo degradado. Sim, é um bairro degradado." Outras pessoas que foram chegando entretanto espantaram-se com a sabedoria do mestre. Uma delas perguntou então "o que é aquilo ali a sair de trás do arbusto, uma mão ensanguentada?" Louçã fuzilou-a com o olhar e gritou colérico "racista, xenófobo". Os seus discípulos, com um olhar vazio gritaram em uníssono "racista, xenófobo". Essa pessoa nunca mais teve coragem de abrir a boca.
Louçã dirigiu-se então aquele que pela reverência com que os outros o tratavam parecia o líder do gang, um jovem a quem chamavam Quinito, e disse-lhe: "Tu estás aqui por causa da crise causada pelo neo-liberalismo, não tens emprego". Quinito olhou o mestre de alto a baixo e disse-lhe "eu tenho emprego, sou mecânico". Mas Louçã não desistiu e insistiu "sim, mas estás aqui porque és pobre". Quinito ficou pensativo, admirado com a sabedoria do mestre e perguntou-lhe " viu as minhas páginas pessoais no Facebook, Hi5 e Myspace?".
Fez-se um silêncio. Quinito, o líder do gang, baixou a cabeça e concedeu perante a sabedoria do mestre "sim, é verdade. Eu tenho uma colecção de carros de luxo.. tenho Ferraris, Porsches... mas não tenho um iate ou um jacto privado. É por isso que ando aqui, sou pobre"
Este foi o primeiro milagre de Louçã, que mais tarde viria a repetir muitas vezes. Louçã conseguia transformar qualquer assassino, pedófilo ou violador em vítima da crise neo-liberal. E assim ficou conhecido por São Louçã, padroeiro dos criminosos.